segunda-feira, 4 de março de 2013

Um discurso prático da fé

segunda-feira, 4 de março de 2013


                                                               Vinicius Seabra

"Irmãos, sigam unidos o meu exemplo e observem os que vivem de acordo com o padrão 
que lhes apresentamos. Pois, como já lhes disse repetidas vezes, e agora repito com lágrimas,
 há muitos que vivem como inimigos da cruz de Cristo”.
Filipenses 3:17-18 (NVI) 

A quase espontânea capacidade de incriminar alguém é proporcional ao interesse de outro 
em se safar de um erro, pois quando se culpa alguém os olhos se voltam para o acusado, não 
para o acusador. Por esta razão um dos mais inquietantes discursos de Jesus Cristo foi acerca
 da hábil facilidade do ser humano de estender o braço e erguer o dedo indicador para 
outrem e culpá-lo de algo. Isto fica notório em Mateus 7:3: “E por que reparas tu no argueiro
 que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho?”. Observe que 
Jesus repreende os fariseus não por terem a capacidade de apontar as falhas alheias, mas
 sim de serem incapazes de observar seus próprios desacertos. Portanto, o cerne da questão
 não é o motivo do julgamento, mas sim as vivências de quem está julgando.

O erro dos fariseus não era o fato de acusar, mas sim o de não terem capacidade de praticar
 o que acusavam. Isto fica explícito no texto de Mateus 23:4: “Pois atam fardos pesados e
 difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos homens; eles (fariseus), porém, nem com 
o dedo querem movê-los” – destaque do autor. Por esta razão Jesus adverte os fariseus:
 “Não julgueis, para que não sejais julgados” - Mateus 7:1. Ao contrário do que se diz por ai, 
Jesus não queria recriminar o fato de se julgar, mas sim a incompatibilidade prática
 (ações/obras) daqueles que acusam. Por isto os fariseus seriam julgados, por não viverem 
aquilo que exigiam dos outros. Em concordância a este postulado o versículo subseqüente
 afirma: “Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que 
tiverdes medido vos hão de medir a vós” - Mateus 7:2.

A inquietante advertência de Cristo aos fariseus se resume da seguinte maneira: antes de 
apontar os erros de alguém atente primeiramente se você está praticando o que exige dos 
outros, pois é isto que igualmente exigirão de você. Portanto, o conceito de “fariseu” não é 
sinônimo de acusador (julgar), mas é aplicável para com aqueles que culpam os outros de 
algo que ele próprio não vive. Então, contextualizando, pode-se afirmar que nas 
vivências eclesiásticas a história farisaica se repete, pois há muitos que impõem aos demais
 diversas obrigações sem que os mesmos as pratiquem. A semelhança dos fariseus, muitos
 cristãos tem se munido de belos discursos espirituosos e de um puritanismo desmedido, pois 
assim podem se esconder atrás de suas vidas inglórias e culpar outros pelos seus 
fracassos ministeriais.

Os fariseus pós-modernos se mostram nas igrejas evangélicas estampando uma 
superioridade espiritual inatingível, pois assim evitam que outros julguem na medida em que
 estes estão julgando – já que no ambiente eclesiástico as pessoas tem medo de 
julgar os “espirituais” (leia-se lideres religiosos, semelhantes ao “encargo” de fariseus nos
 tempos bíblicos). Estes confundem (de forma intencionalmente) o termo insubmissão com o
 conceito de contestação. Segundo os dicionários o termo “insubmisso” se refere a alguém 
que seja altivo e independente. Contrariamente, o termo “contestação” se refere à capacidade
 de negar a rigorosidade de alguém. Por tanto, não é insubmissão questionar aqueles que 
estão nos pedestais exigindo algo das massas, é contestação – isto é bom para o cristianismo,
 mas ruim para os fariseus.

Os fariseus dos tempos contemporâneos gostam de apontar inúmeras falhas eclesiásticas,
 são capazes de propor muitas estratégias evangelísticas, se alegram com sugestões inovadoras
 para o culto e se rejubilam com o fato de poderem fazer melhor do que já é feito. Entretanto,
 estes são incapazes de colocar em prática a menor das homilias – por esta razão são 
fariseus. Devido à presença indiscutível dos fariseus no seio das igrejas é que, por fim, se 
aprende a não mais dar tanto valor para o que as pessoas dizem, e então, se aprende a 
arte de escutar o que as pessoas fazem. Esta é a gritante diferença entre fariseus e 
cristãos, o primeiro se limita ao falar, o segundo se satisfaz em fazer.

Os fariseus eclesiais da atualidade sempre tendem a ter “dois pesos e duas medidas” –
 sobre os outros é pesado, sobre si próprio é leve. Portanto, é válido relembrar o poema
“Quando outra pessoa não faz algo, é preguiçosa; quando eu não faço, estou ocupado. 
| Quando outra pessoa reclama, é intrigante; quando eu falo, é crítica construtiva. | 
Quando uma pessoa teima, é cabeça-dura; quando eu faço, estou sendo firme e coerente. | 
Quando outra pessoa fala de si mesma, é egocêntrica; quando falo, preciso desabafar. |
 Quando outra pessoa encara os dois lados do problema, é indeciso e fraco; quando eu o 
faço, sou compreensivo. | Quando outra pessoa faz algo sem ordem superior, estava excedendo
 suas funções; quando eu o faço, é iniciativa” – texto de autor anônimo.

Enquanto as igrejas ainda continuarem sendo o recôndito para os fariseus, então, a 
frase de Margaret Mead (antropóloga, 1901-1978) continuará a ecoar: “O que as pessoas
 dizem, o que as pessoas fazem e o que elas dizem que fazem, são coisas inteiramente 
diferentes”. Portanto, a igreja evangélica brasileira precisa de cristãos que ousem questionar 
(julgar) sem medo de igualmente serem julgados na mesma medida; cristãos que não
 sejam espirituosos, mas sim espirituais, ao ponto de entenderem que são seres humanos 
passivos de erros; cristãos pensadores que ousem romper a medíocre linha do discurso e
 arrisquem sofrer as conseqüências do fazer.

Por fim, é válido criar um diálogo entre dois grandes pensadores ativistas, Martin Luther King 
(1929-1968), que afirma: “O que mais preocupa não é o grito dos violentos, dos corruptos, 
dos desonestos, dos sem-caráter, dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos
 bons”. E, Edmund Burke (1920-2001), que completa: “Ninguém comete erro maior do que não
 fazer nada porque só podia fazer pouco”. 

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br



Artigo escrito em: 23 de Fevereiro de 2010

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